quinta-feira, 15 de maio de 2014

Velhas estradas, novos horizontes.



Ali estava, serpenteando, sinuosa, quase que dançando, até tocar o horizonte. "Então é assim que ela se apresenta a todos", pensou, concluindo que a estrada levava pessoas, mas trazia muito mais. Aos viajantes, presenteava trazendo nas asas da brisa o cheiro do mundo. Tanta gente passava por ali e não se deliciava com aquela canção afinada que o vento cantava enquanto entrava pela janela do carro para acariciar seus cabelos... Tanta gente passava por ali e não sorvia aos goles aquela estrada de asfalto e sonhos...

Pontes, curvas e retas, colinas, montanhas, lagos, rios e riachos, verdes, azuis, amarelos e laranjas, tudo isso ela oferecia generosamente, como se quisesse cativar aos que por ela trilhavam, deixando sempre saudades e lembranças daquilo que logo se via pelo retrovisor do passado.

E sempre que se quiser, ela estará lá, disponível, pronta para te levar até o fim do mundo, se você for ousado o bastante para percorrê-la... pouca gente se apercebe que o horizonte é muito maior que aquela linha que limita o até onde a vista alcança. As pessoas escolhem um destino e tomam o caminho para alcançá-lo, mas poucos são os que percebem que o destino está destinado a ser o caminho em si.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Janela da alma.


Uma brisa gelada tomou a sala de estar, entrando pela veneziana e percorrendo logo toda a casa. Da janela, um menino magrinho olhava as outras crianças brincando na neve. Revelava-se em seus olhos um misto de sentimentos, um pouco de melancolia, de inveja por não estar naquela vastidão branca com os seus vizinhos. Aquele vento o colocava a tiritar.

Então ele decidiu trocar de roupa e foi se agasalhar. Ao abrir o guarda-roupa, viu lindas bermudas multicoloridas, com estampas de florais, camisas com temas alegres, cores vibrantes, roupas com as quais ele havia brincado a primavera e o verão inteiro naquele quintal que antes era verde e que agora o inverno tingia com alvura. Mas não tinha nenhum cachecol, por mais cinzento que fosse. Nada de luvas, botas, casacos, lã ou couro. E de repente ele percebeu que havia guardado aquelas roupas por tempo demais, elas eram bonitas, mas já não lhe serviam. Fora preciso um duro inverno chegar para ele se aperceber disso .

Mas, fosse como fosse, o menino queria brincar, e aquela sala monótona já havia o aborrecido. Então, vestiu um casaco da mãe, sem se importar com o fato dele ser cor de rosa, calçou um par de coturnos de pelica do pai, sem reparar que eles eram sete números acima do tamanho do seu pé, colocou uma calça velha apertada e desbotada. Limpou os pés no capacho, mergulhou no alvo inverno e fechou atrás de si a porta da entrada da casa, deixando para trás a sala de contemplações monótonas e tristezas aborrecidas.

sábado, 3 de março de 2012

Desilusão

O sino da igrejinha branca badalou anunciando a hora naquela pequena cidade. Exatamente cinco toques, correspondentes às cinco da tarde. Aquele barulho foi o suficiente para despertar um rapaz que, longe dali, assistia em transe aquele horizonte magnífico do crepúsculo.

Fisicamente estava ali, debaixo daquele pé de algaroba, mas seus pensamentos iam longe, além daquelas nuvens que salpicavam o céu de laranja e branco. O curioso é que, quanto mais ele se distanciava em seus pensamentos, mais próximo de si estava. Assistia com angústia desesperada ao filme dos seus sentimentos, como se eles passassem ali, numa tela imaginária, no lugar daquele horizonte tão belo que ele parecia desprezar.

Era um rapaz simples, mas longe de ser simplório. A vida toda fora um sujeito vibrante, daqueles que contagiam os que lhe rodeiam pelo viço de sua personalidade, pelo brilho de sua pessoa e do seu olhar, estava sempre entusiasmado com qualquer coisa. Mas agora... Bem, agora tudo era diferente. As vezes ele se perguntava quando foi que aquilo aconteceu. Em qual esquina do destino ele virou e deixou de trilhar aquela estrada bonita para se encontrar naquele beco sombrio e sem saída?

Sentia-se morto, como se tivesse desistido de si mesmo, tudo era frio, opaco e aguado. Há muito deixara de crer no que dizia aos outros, no que dizia a si mesmo... Já não mais cria na própria capacidade, de sorte que as forças lhe esvaíram e não lhe restara mais ânimo nem mesmo para perseguir antigos objetivos, manchados pelo lodo do desprezo. Questões que outrora ensejavam debates com os quais se empenhava a ferro e fogo em defender o seu ponto de vista, hoje, ao se deparar com uma dessas, dava de ombros e seguia a passos largos pela calçada da viela empoeirada da indiferença. De uns dias para cá, nem se dignava a dizer mais nada. Quando muito, murmúrios, isso se estivesse de bom humor. Não valia a pena.

Lembrou-se com desgosto do que havia pensado durante o almoço, quando a mulher que trabalhava na sua casa serviu a mesa e sentiu certa inveja. Sorte das pessoas mais simples, que não têm que enfrentar os conflitos existenciais. O caminho delas é tão mais fácil! Nem titubeiam, só seguem em frente, sem dúvidas, sem olhar para os lados ou para trás. Não lhes assediam as noites os problemas do universo, as indagações sobre valores que não fossem os das contas de luz a serem pagas. Gostava de pensar nessas questões como fardos de tijolos de cristais, pesados, difíceis de serem carregados e frágeis ao ponto de se estilhaçarem ao menor dos impactos. Depois de quebrados, cristal e caráter não se emendam.

Pensou tudo isso em uma fração de segundos, epifania de uma razão que agora já não mais fazia sentido. Ouviu o último badalo, soltou um suspiro resignado, desceu a rua e se afastou da algarobeira e de si mesmo, deixando para trás razão, paixão, sonhos e lembranças. Agora, nada mais importava.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Treinadas Para Matar (TPM)

O motivo que me faz debruçar sobre esse amontoado de rascunhos novamente e sair do ostracismo – sono dos justos e cansados de guerra - é dos mais sérios da vida moderna: A tal da TPM. O dia então não poderia ser mais apropriado, justamente no dia internacional da mulher (agora é novidade, tudo tem que ser exclusividade feminina, já não basta a lei Maria da Penha).
Segundo o wikipédia, que ensina a nós todos, TPM é a retenção de algumas substâncias (principalmente água e sódio) que alteram o funcionamento do metabolismo. Peraê, mermão! Alteração química do metabolismo e consequentemente comportamental? Isso não é nenhuma novidade para nós. Ora, isso é um fenômeno também frequentemente observado nos homens: embreaguez. A marmanjada está cansada de saber.
O grande xis da questão, onde está o coringa do baralho, é que a mulher de TPM pode tudo. Em alguns países desenvolvidos, a TPM passou a ser utilizada como defesa ou circunstância atenuante de pena, pois quem é acometida de TPM, fica demasiadamente sensível e essa sensibilidade exacerbada pode alterar o poder de discernimento da mulher. É o que diz o Doutor Guilherme Rôla, autor de "Tensão pré-menstrual como circunstância de diminuição de pena". (Pra quem quiser ler, link do jurista tão bem nomeado: http://www.eunanet.net/beth/news/topicos/informativo10.htm)
Ora, mas que diabos! Toma cachaça que tu vais ver o que é alterar o poder de discernimento! Se a mulher mata o marido treloso e alega que estava sob os efeitos da TPM, com um bom advogado e uma psiquiatra perita sapatão, daquelas bem feministas, é capaz de ser inocentada, e, além disso, condenar ao defunto a ficar recluso 30 anos no seu caixão, sem poder sair dele, aquele malvado!
Já o boêmio que toma o seu cafezinho no botequinho da esquina, chega em casa e se depara com a mulher e o buliçoso - e, dominado por fortes emoções, faz cessar de existir sua amada e ingrata esposa e o rapaz que mexia no que era dos outros - é um bêbado covarde, estava bebendo para tomar coragem e dar cabo aos pombinhos adúlteros. A conseqüência disso?! Vai ter sua pena agravada e ainda vai ficar conhecido como corno frouxo no sindicato dos cachaceiros.
Pois é, agora é moda essa permissibilidade exagerada. Está certo que se deve existir uma certa tolerância, uma margem de compreensão maior, mas, como diria o brilhante André Andrade, vulgo Macaco: “Tudo dimai é munto”.

sábado, 5 de setembro de 2009

Dias...

Nada lhe agradava mais que aquele cenário. O ruído das ondas, o cheiro de maresia, a brisa acariciando suavemente algumas delicadas flores que, ao mais brando dos ventos, concederia suas pétalas, só para enfeitar ainda mais a atmosfera que perfumava.

Ele pensou que havia beleza nos dias azuis de nuvens ausentes, sol reluzente e águas claras, mas nem de longe se equiparava ao charme bucólico dos dias cinzentos, mar revolto e brisa úmida. Hoje era certamente um desses. Dias que não revelam que horas são, nem a estação do ano em que estamos, que nos envolve em nevoeiros, onde se raramente vislumbra além dos horizontes turvos. Dias misteriosos.

Do alto daquela falésia, sentado em um tronco retorcido do que fora em outros tempos um imponente carvalho, ele se atirou em pensamentos. Adorava aqueles dias convidativos, contemplativos, introspectivos. Quase podia sentir no palato o gosto deles. "A despeito da pouca visibilidade, é quando se enxerga melhor, pois aprende-se a confiar mais nos demais sentidos." pensava o rapaz.

Lembrava-se de quando era mais velho, do que lhe fora prometido em dias fulgurantes de verão, da esperança de tudo ser azul, lembrava das perspectivas frustradas, de pássaros cantando sonhos alegremente, onde tudo parece possível, onde tudo parece tão fácil e feliz. A chuva lavou alguns erros dos seus ombros, levou consigo alguns anos que lhe pesavam e semeou novos projetos, dessa vez menos impetuosos.

Não restava mais espaço para ser amargo, mas não podia deixar de sentir a melancolia daqueles dias cinzentos, dias que não revelam que horas são, nem a estação do ano em que estamos, que nos envolve em nevoeiros, onde se raramente vislumbra além dos horizontes turvos. Dias misteriosos.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Outono

Quando o verde viçoso se esvai, levado pela brisa fria que desce a colina - anunciada pela agitação da multidão de capins e teimosas margaridas remanescentes - para então dar lugar a tons pastéis e frios.

Quando os dias de primavera e verão decidem abandonar a vida, levando consigo todo o colorido, para então deixar o alaranjado em ocres de tristeza e melancolia.

Quando perder a derradeira folha parece ser a única coisa a se fazer para enfrentar as torrentes turbulentas, precedentes das tempestades de um inverno que já espreita por detrás dos montes.

Quando o horizonte estampa a fúria das nuvens que se avizinham, portadoras das mais pesadas trevas, raios que parecem querer partir os céus e a terra, trovões que retumbam consoante a todo o resto.

Embaixo daquela árvore, tão iguais as demais, tão singular para mim, lembrava amargamente de como tinha sido aquele parque há alguns meses e recordava o que me disse um velho amigo de olhos tristes: "Caem as folhas da razão, maldito outono de saudades." Veio imediatamente à minha cabeça outros tempos, quando o presente não se fazia imperioso e o futuro ainda era futuro... Saudades do futuro.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Postarei desta feita algo que não foi escrito por mim, e sim pelo famoso político e boêmio Gustavo Krause. Sintetizou com perfeição a maneira como o verdadeiro boêmio saboreia a vida em pequenos goles. É algo que realmente vale a pena ser postado e, sobretudo, lido.

1º - O boêmio ama a noite sobre todas as coisas;
2º - O boêmio ama o próximo mais do que a si próprio;
3º - Para o boêmio, a mulher do próximo é a mais distante;
4º - O boêmio não briga;
5º - O boêmio transforma suas ex-namoradas em grandes e solidárias amigas;
6º - O boêmio vive como gosta;
7º - O boêmio está sempre duro. Deixa pendurada mas paga a conta para não perder o crédito
8º - O boêmio não se embriaga. Tira mais da bebida do que a bebida do boêmio;
9º - O boêmio bebe por prazer e come por obrigação;
10º -O boêmio é versado em muitos assuntos, mas não consegue falar sobre a vida alheia.


UM BRINDE!!