terça-feira, 18 de setembro de 2007

O último trago.

Caia uma tempestade de Noé lá fora, mas nada parecia importar àquele rapaz. Uma mesa de carvalho escura, uma grade de cerveja por completar, um banquinho de três pernas que o acomodava e, à sua frente, um copo americano, nunca vazio, mas raramente transbordante... Podia-se ouvir muito de longe o cantarolar da vitrola daquela vizinha gorda tocando um bolero de Bienvenido Granda. Assim era aquela tarde, pintada em tons de cinza e ocre.

Sentia sua alma reverberar a cada gole. Tinha uma decisão importante pela frente e a cerveja - companheira há muito e de sempre - o encorajava. Procurava encher o peito de coragem à medida que esvaía o conteúdo daquelas garrafas... Mas era outro sentimento que lhe tomava, e não era angústia, mas um desalento quase prostrado... havia se conformado. Bebeu até completar o engradado, mas guardou o gole derradeiro... Ah, aquele certamente seria sagrado, acompanhado por um ritual, uma espécie de meditação. Repassou todos os anos vividos melancolicamente e, pela primeira vez na vida, não sentia saudades do futuro. Suspirou e sorveu o último trago daquele precioso líquido amargo, que lhe adocicava e dourava a vida, que, a partir de então, seria fosca e gris, exatamente como aquela tarde.


Ao Trem Bão.

2 comentários:

Rodrigo Bizouro disse...

Snif, Snif!!
Coitada da cerveja, ficou abandonada! huahuauha
Show de bola mesmo, tas pensando em parar de beber é??
hahhhahahah
Qndo eu li, so imaginei vc!
Abraço paulinho!

Samizdat1905 disse...

Ao Trem Bão! Lugar de muitas e boas histórias!